sexta-feira, abril 06, 2007

Vagas sucessivas


Fim do dia, fim de mais um dia. Tenho o ruído do dia acumulado nos ouvidos. Horas de imagens sobrepostas nos olhos. Formam uma só imagem indistinta. Ocre. Desfocada. Entro pela porta e fecho-a na cara de uma pele que usei todo o dia. Para agora a olhar com repugnância. Vejo-a como se não fosse minha. Sem desejo de a voltar a vestir. Sinto os músculos doridos. As mãos parecem não me obedecer. O meu espírito tenta em vão içar um corpo que já desistiu. E tu estás ali. Vejo-te. Sinto mais uma a tua desistência diária. Avanço para ti sem ânimo. Lenta, dolorosamente ergo o braço cansado. Os músculos retesam-se descontroladamente. As veias salientes no braço. Consigo ver nelas O stress e a angustia que as percorrem. A minha mão levantada parece não ser minha. Esteve não sei onde. Não a reconheço. Nesse instante, como todos os instantes como este, em todos os dias púrpura como estes, de repente... o silencio. O silencio da praia deserta. O silencio de quem só ouve o que vem de dentro. E de repente... a minha mão desenrola-se na tua pele. Numa carícia que sempre parece impossível. Para sempre nos surpreender. E tu sorris como só tu o fazes. A tua pele fica mais macia sob a minha mão. Como a areia molhada. Toda a impetuosidade de um mar. Toda a fúria de um oceano. Numa onda. Agora dormes.
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Texto: Luis - Giraluas
Foto: olhares

1 comentário:

Anjos Sem Asas disse...

Luis
Pena só nos brindares com a tua escrita de quando em quando.
Tens magia nas tuas palavras.
Beijo da amiga Mia